Considerado um verdadeiro tsunami, muito pela qualidade de informação, provas e detalhes que tem sobre o processo da contratação das dívidas ocultas, a audição do franco libanês, Jean Boustani, esta sexta-feira, era aguardada com muita expectativa, contudo, à boca do tribunal o Juiz Efigénio Baptista, muitas vezes acusado de estar a proteger o Presidente da República, Filipe Nyusi, anunciou, esta quinta-feira (um dia antes), que o mesmo não será mais ouvido, supostamente porque é réu num outro processo que corre termos no Ministério Público, um argumento por muitos tido como incoerente pelo facto de Ernesto Gove, Joana Matsombe, Valdemar de Sousa e, até, Alexandre Chivale, serem declarantes, mesmo sendo réus em processos autónomos em curso.Jean Boustani, por muitos considerado o cérebro por detrás da concepção do projecto das três empresas e que assumiu em sede do Trubunal, em Nova York ter efectuado pagamentos a algumas pessoas em Moçambique, incluindo o partido no poder e Filipe Nyusi para a campanha em 2014, devia ser ouvido amanhã em vídeo-conferência e as autoridades libanesas já tinham tudo preparado.No entanto, por decisão do tribunal, Jean Boustani, que se esperava que expusesse detalhes sobre o envolvimento de Filipe Nyusi e de outras figuras políticas relevantes no processo da contratação das dívidas ocultas, acaba de ser descartado como declarante.O juiz, que já veio de casa com a decisão tomada, disse recebeu uma solicitação da Procuradoria Geral da República (PGR) evocando que o declarante Jean Boustani não fosse ouvido no principal processo das dívidas ocultas por ser réu num outro que corre termos em instrução preparatória no Ministério Público.“Estava prevista para amanhã, dia 03 de Dezembro, a audição do senhor Jean Boustani por vídeo conferência, mas o Ministério Público submeteu ao tribunal um documento em que primeiro as autoridades libanesas informavam que já tinham tudo criado para que fosse ouvido. E o Ministério Público também aproveitou informar que o senhor Jean Boustani é arguido constituído no processo número 372/11/P-2020 em curso na Procuradoria da República da Cidade de Maputo. E o tribunal não tinha essa informação de que o senhor Jean Boustani é arguido num processo a correr termos na PGR”, começou por dizer Efigénio Baptista.Prosseguindo, disse que “ e porque Jean Boustani é arguido num processo a correr termos na PGR não pode ser ouvido neste processo como declarante para ser interrogado sobre os mesmos factos. Por isso o tribunal revogou o despacho de audição do senhor Jean Boustani e não mais será ouvido neste processo como declarante, justamente por ser arguido num outro processo, em que é imputado factos de corrupção activa”.Advogado Abdul Gani inconformado com a postura do tribunalA justificação do juiz não caiu de bom tom para os advogados, em particular ao decano Abdul Gani que reclamou que o tribunal estaria a adoptar uma dualidade de critérios, pois ouviu os declarantes Ernesto Gove e Joana Matsombe, e estava a se preparar para ouvir Waldemar de Sousa, Manuel Chang e, até Alexandre Chivale, sendo supostamente réus em processos autónomos abertos pela PGR.“Se esta é a razão invocada pelo Ministério Público e que consequentemente o tribunal acaba por acolher, importa referir o seguinte: neste tribunal foi autorizada a audição do senhor Manuel Chang, foi ouvida a senhora Joana Matsombe, foi ouvido o senhor Ernesto Gove e está prevista a audição do senhor Valdemar de Sousa. As quatro pessoas aqui invocadas já foram acusadas pelo PGR, o processo está distribuído na 10 secção com o número 52-2020, pelas mesmas razões aqui evocadas pelo Ministério Público, que estranhamente no referente a estas pessoas não se opôs. Terá que haver aqui um tratamento igualitário. É uma questão de direito e coerência”, sustenta.A situação gerou um intenso debate. O Ministério Público, através da procuradora Ana Sheila Marrengula, sem grande argumento, alegou que os declarantes citados pelo advogado Abdul Gani foram arrolados pelo tribunal e pelo assistente no processo, a Ordem dos Advogados de Moçambique e coube apenas a aquele sujeito processual comunicar ao tribunal.Por seu turno, o juiz, no seu estilo característico referiu que a sexta secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo não tem conhecimento formal de que aqueles declarantes foram constituídos arguidos em processos autónomos, mas reconheceu que o declarante Valdemar de Sousa, ex gestor do Banco de Moçambique, poderá também não ser ouvido para não se criar a percepção de dualidade de critérios.No entanto, o juiz não esclareceu o que sucederá com o caso dos declarantes que já foram ouvidos e, em sede do tribunal, deram declarações comprometedoras não só para si como também para a estratégia da defesa dos réus.

Fonte: Folha de Maputo

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