Os olhos dela brilham quando fala quando fala de Giraldo. “É grande, preto, gordo. A maior paz de alma de sempre, não tem maldade nenhuma”. Giraldo é o cavalo de Inês Alemão Teixeira, atleta da equipa de paradressage da Academia Equestre João Cardiga. “Os cavalos da paradressage têm que ter esta qualidade de conseguirem estar em todas a situações e nada lhes fazer diferença. Acima de tudo prezamos pela segurança do atleta”, detalha a atleta.

A paradressage é uma modalidade de equitação, adaptada a pessoas portadoras de uma deficiência física ou mental. Inês Alemão Teixeira, 25 anos, tem paralisia cerebral com 65% de incapacidade física. “Foi por falta de oxigenação no cérebro – anoxia”.

Inês tem uma irmã gémea e foi durante o crescimento que os pais perceberam que havia diferenças entre as duas. “Começaram a acontecer coisas com ela que não aconteciam comigo. E foi aí que percebemos que haveria algum problema que poderia estar derivado à falta de oxigenação no cérebro”, recorda.

Quem vê e ouve Inês Alemão Teixeira nem se lembra que tem paralisia cerebral, tal é a desenvoltura e agilidade. A própria atleta recorda foi fácil lidar com a doença devido ao apoio da irmã e dos pais. “Os meus pais nunca me meteram numa bolha. Nunca fiz nada de forma diferente dos outros. Estudei pelo ensino regular, formei-me, licenciei-me e, neste momento, estou a trabalhar”.

Inês trabalha na Associação Salvador na área de gestão de eventos mas dedica muito tempo à equitação. Passa os dias na Academia Equestre João Cardiga a alimentar uma paixão que começou como uma terapia. “Já não é terapêutico, é pela paixão ao animal, pela paixão ao desporto e, se assim não fosse, não dava para fazer de outra forma porque são muitas horas, muitos treinos, não só a cavalo, fora do cavalo. Envolve fisioterapia, psicólogo”, detalha.

A atleta pratica equitação há cerca de 16 anos e compete há 10. A modalidade já levou Inês até aos Estados Unidos para os Jogos Equestres Mundiais e agora prepara-se para o Campeonato da Europa na Holanda em agosto de 2019 e para os Jogos Olímpicos 2020. “O objetivo maior é Tóquio 2020. Queremos muito que nos abram a porta para nós chegarmos a Tóquio enquanto equipa portuguesa e enquanto atletas, queremos muito conseguir ter uma equipa nos jogos paralímpicos”, revela.

Um AVC aos sete anos

Quem também quer muito competir por Portugal é Ana Luiza Berbari. A atleta brasileira chegou ao país há pouco tempo mas a família está já a tratar do pedido de nacionalidade através do avô, que é português. Antes de sair do Brasil, já lhe falavam da Academia Equestre João Cardiga.

“A minha vida deu um pulo muito grande porque eu conheci a Academia João Cardiga e tudo mais. As coisas estão dando muito certo. Viver aqui é muito bom, comparado a São Paulo, não tem palavras. Portugal é muito calmo e muito bom”, explica a atleta.

Ana Luiza tem 19 anos. Aos sete teve um AVC que lhe afetou os movimentos do lado esquerdo do corpo. “É uma história assim bem impactante para as pessoas porque tive muito nova”.

Sempre teve contacto com cavalos e os médicos indicaram a hipoterapia como forma de tratamento. “Eu adorava. Eu adorava os cavalos, estar pertinho deles”, conta, explicando que foi sentindo melhorias ao longo dos anos. “Melhorias no corpo. Também me sentia super calma quando estava em contacto com o cavalo e sempre gostei do ambiente”, conta.

Equitação para todos

A Academia Equestre João Cardiga prepara atletas com e sem deficiência com um foco importante na equitação terapêutica, mas também na competição. A caminhada começou há sete anos com o objetivo de chegar aos olímpicos e aos paralímpicos. A academia treina Sara Duarte, a única cavaleira bi-paralímpica portuguesa, que recebeu uma menção honrosa do 5.º lugar nos Jogos Paralímpicos de Pequim. A academia está no ranking internacional da Federação Equestre Internacional com sete atletas com e sem deficiências, com o objetivo de representar Portugal com uma equipa já nos jogos de Tóquio 2020.

Maria de Lurdes Cardiga, presidente da direção da academia, recorda que a modalidade é cara e só com apoio dos patrocinadores têm conseguido levar a equipa de paradressage mais longe. “Tendo em conta que esta academia pretende preparar de uma forma inclusiva, abraçar todas as pessoas que tenham talento e preparar atletas que representem ao mais alto nível o nosso país, estamos aqui a falar de necessidades sempre de mecenato e de investimento de patrocinadores. Daí que os Jogos Santa Casa nos têm permitido manter esta continuidade. Sem eles não teríamos certamente conseguido”, reconhece.

Maria de Lurdes Cardiga garante que a equitação pode ter resultados terapêuticos importantes sobretudo devido à relação entre atleta e animal. “O cavalo é um animal poderoso, grande. A relação que se estabelece entre uma pessoa que, perante um ser que tem um poder maior do que o dele, e que ainda assim se consegue docilmente conduzir pela pessoa, é logo em si mesmo uma fórmula mágica de criar uma autoestima dentro de nós”.

A presidente da direção explica que “não se fazem milagres” mas garante que a hipoterapia ajuda a melhorar o equilíbrio e a motricidade, contribuindo também para avanços a nível social, educacional e cognitivo.

Fonte:TSF Desporto

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